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Foto do escritorcleudsonvieira

Um gesto de amor


Tenho o hábito de acordar cedo e reservar o primeiro horário para atividade física. Naquela manhã não foi diferente. Havia um cenário preestabelecido de tarefas a cumprir: tantos minutos de deslocamento até o local do treino, tantos minutos de atividade física, tantos minutos de retorno pra casa, bem como para os demais afazeres do dia.


Reparei que uma cobertura alaranjada se estendia por toda a cidade. Uma tenda a céu aberto transformava as ruas, as casas, o silêncio numa plateia privilegiada do espetáculo. Por um momento me distanciei do cronograma de tarefas, e pensei – o quanto deve ser bom ter um tempinho a mais. Há tempo que passo por aqui, nesse mesmo horário, e ainda não tinha visto essa tenda. Pensando bem, quem sabe a falta de tempo nunca me deixou vê-la.


O tempo corria. Por outro lado, os substratos da memória não seriam suficientemente apresentáveis para tanta beleza, por isso precisava eternizar aquele momento. Mas, como faria isso sem ter tempo? Mesmo assim, não fiz o registro da imagem. Resolvi guardá-lo comigo - na memória - e continuei no caminho...


Às vezes, é melhor apreciar o presente, estando realmente presente, do que desperdiçá-lo em troca de uma lembrança não vivida.


Assim como num show em que várias coisas acontecem ao mesmo tempo: a animação do público, o jogo de luzes, a performance de um artista. Também, várias coisas aconteciam naquele dia. O semáforo incansavelmente exercia a sua função; as calçadas, à espera do público; as ruas, prontas para a agitação dos carros. E, por sorte, apenas uma pessoa figurava no caminho. No futuro, a minha crônica seria a prova viva de tudo.


Na expectativa de encontrar uma resposta mais convincente para mim mesmo, concluí, enquanto aguardava o sinal verde do semáforo: talvez a sorte seja simplesmente um fruto do acaso, e nada mais.


O silêncio preenchia os espaços com uma coloração amanhecida. As árvores partilhavam o seu contentamento com o vento (leve, macio e primoroso) embalando suas folhas numa dança ao ar livre.


De repente, observei que não estava mais sozinho. Avistei um grupo de pessoas, e na medida em que chegava mais perto a quantidade de pessoas parecia ser bem maior. Fiquei encantado! Era a cena mais linda já vista naquele dia.


Na calçada tinha uma fila imensa de pessoas que aguardavam ser atendidas por um grupo de mulheres. Elas serviam alegremente um café da manhã. Doavam algo mais que especial. Desprendiam-se um pouco do seu tempo para ajudar o próximo. Elas distribuíam afeto: um gesto de amor, carinho e atenção.


Eu estava feliz por todas as coisas oportunizadas naquele dia, mas precisava de um registro, nem que fosse artesanal ou manuscrito. Peguei um pedaço de papel, uma caneta e escrevi: hoje eu vi umas mulheres humanas com gestos de anjo.

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